Decisão judicial reconhece relação familiar multiespécie e estabelece pensão alimentícia para cão – Balcao News – Notícias de BH

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Em uma decisão pioneira na Comarca de Conselheiro Lafaiete, Minas Gerais, a Justiça determinou que um casal deverá dividir os custos com o cuidado de seu animal de estimação, após o término do relacionamento.

A sentença foi proferida pelo juiz Espagner Wallysen Vaz Leite, da 1ª Vara Cível, e considerou o conceito de “relação familiar multiespécie”, que reconhece o vínculo afetivo entre humanos e seus animais de estimação.

Pensão alimentícia para o cão com doença crônica

A autora da ação, uma moradora de Conselheiro Lafaiete, obteve na Justiça o direito de receber uma pensão alimentícia provisória, correspondente a 30% do salário mínimo, destinada ao custeio das despesas com seu cão, que sofre de insuficiência pancreática exócrina, uma doença grave que demanda cuidados especiais e contínuos.

Segundo o processo, o animal foi adquirido durante o casamento da autora com o réu, e atualmente vive sob a tutela da mulher, que arca sozinha com os elevados custos do tratamento veterinário, incluindo medicamentos e alimentação específica. A tutora apresentou à Justiça diversos documentos, vídeos e fotos comprovando o estado de saúde do animal e a necessidade do tratamento contínuo.

Relação familiar multiespécie e direito de família

Ao analisar o caso, o juiz Espagner Leite destacou que o vínculo entre o casal e o cão configura uma relação familiar multiespécie, um conceito reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Esse tipo de relação envolve o núcleo familiar humano e seus animais de estimação, estabelecendo uma ligação afetiva que, em algumas situações, pode ser levada aos tribunais para garantir o bem-estar do animal.

“Esse conceito vem ganhando espaço na sociedade brasileira, gerando variadas discussões que, inevitavelmente, têm sido levadas aos tribunais. Nesse processo, é possível verificar que o animal de estimação parece ter o afeto de ambas as partes”, afirmou o magistrado.

Divisão de custos: decisão inédita no direito brasileiro

O juiz também ressaltou que, embora os animais de estimação não possuam personalidade jurídica, eles são sujeitos de direitos, incluindo a proteção ao seu bem-estar. A decisão foi fundamentada na necessidade de divisão equitativa dos custos do tratamento veterinário, visto que o cão demanda cuidados específicos e contínuos.

Espagner Leite argumentou que os gastos relacionados à saúde do cão devem ser suportados por ambos os tutores, uma vez que o animal foi adquirido em comum acordo e possui um forte vínculo afetivo com ambos. A decisão baseou-se no princípio de que, ao fim de um relacionamento, as responsabilidades em relação ao animal de estimação também devem ser compartilhadas, especialmente quando há comprovação de necessidade financeira.

Pensão fixada com base no salário mínimo

Como o réu não apresentou documentos que comprovassem sua renda mensal, o juiz fixou a pensão alimentícia com base no salário mínimo, determinando que o valor de 30% seja depositado até o dia 10 de cada mês, em conta a ser informada pela autora. “A obrigação alimentar deve ser depositada até o dia 10 de cada mês, em conta a ser informada pela autora”, determinou o magistrado.

O magistrado observou que, embora a renda do réu não tenha sido comprovada nos autos, a fixação da pensão levou em consideração os princípios de razoabilidade e proporcionalidade, visando garantir que o cão receba os cuidados necessários para o tratamento de sua doença.

Audiência de conciliação e trâmites processuais

Além de fixar a pensão alimentícia, o juiz determinou a realização de uma audiência de conciliação, conforme previsto no artigo 695 do Código de Processo Civil. A audiência será realizada no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) de Conselheiro Lafaiete. Caso as partes não cheguem a um acordo, será iniciado o prazo para contestação e o processo seguirá os trâmites regulares até a marcação do julgamento definitivo.

Essa decisão judicial reflete um novo entendimento sobre as responsabilidades dos tutores de animais de estimação, principalmente em casos onde há um vínculo afetivo claro e comprovado. A medida pode abrir precedentes para outras ações semelhantes no Brasil, reforçando a importância de reconhecer os animais como membros da família e garantindo sua proteção em situações de ruptura familiar.

Implicações legais e sociais da decisão

A sentença proferida pela Justiça mineira representa um avanço no campo do Direito de Família, ao reconhecer a relevância das relações multiespécies e suas implicações legais. Em um cenário onde cada vez mais pessoas consideram seus animais de estimação como membros da família, decisões como essa ajudam a consolidar o entendimento de que a responsabilidade pelo bem-estar dos pets deve ser compartilhada, mesmo após o fim de um relacionamento.

Especialistas em Direito de Família apontam que o reconhecimento da relação multiespécie é um reflexo da evolução dos valores sociais, onde o afeto e o cuidado com os animais ganham destaque. Essa mudança de paradigma exige uma adaptação das normas jurídicas, que passam a contemplar a proteção dos direitos dos animais dentro do contexto familiar.

Desafios e perspectivas para o futuro

Embora ainda sejam raras, decisões judiciais como essa têm se tornado mais frequentes, acompanhando uma tendência global de valorização dos direitos dos animais. Países como Argentina, Espanha e Portugal já possuem legislações que reconhecem o status jurídico dos animais de estimação e estabelecem diretrizes para a guarda compartilhada e o custeio das despesas em casos de separação.

No Brasil, o crescimento das famílias multiespécies e o aumento das disputas judiciais envolvendo animais de estimação evidenciam a necessidade de uma regulamentação específica que ofereça maior segurança jurídica para tutores e proteja os direitos dos pets. Propostas legislativas nesse sentido têm ganhado força, mas ainda enfrentam desafios, como a resistência cultural e a necessidade de adequação das leis aos novos modelos familiares.

Para a sociedade, a decisão do juiz Espagner Leite é um marco importante que pode incentivar o debate sobre a responsabilidade compartilhada em relação aos animais de estimação. Ao reconhecer que os pets possuem direitos e merecem proteção jurídica, a Justiça dá um passo significativo na construção de uma sociedade mais consciente e responsável em relação aos seres com quem convivemos.

Um novo olhar sobre os direitos dos animais de estimação

A decisão da Justiça de Conselheiro Lafaiete marca um momento de transformação no Direito de Família e no reconhecimento das relações multiespécies no Brasil. Ao estabelecer que o casal deve dividir os custos com o tratamento de seu cão, o Judiciário reafirma a importância do cuidado e da proteção dos animais como parte integrante da família.

Essa nova abordagem representa uma mudança significativa na forma como a sociedade vê os animais de estimação, não apenas como propriedades, mas como seres com direitos que devem ser respeitados e protegidos. O caso reforça a necessidade de adaptações legais que acompanhem as mudanças sociais e garantam que os animais sejam tratados com o respeito e o cuidado que merecem, independentemente das circunstâncias familiares.

Assim, a decisão não apenas atende ao interesse do animal, mas também sinaliza um avanço na proteção dos direitos dos animais de estimação, refletindo uma sociedade que, cada vez mais, reconhece e valoriza o papel dos pets nas famílias contemporâneas.

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Fonte: Balcão News

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